2005-01-11
Da bancada para o relvado
Preocupado com o patente perigo de a prometedora briga acabar em abraços e nalgum "bloco central PUXA-ÁGUA" arrisco colocar aqui umas futurológicas opiniões como quem sopra no brasido e espera atear o fogo de novas e oportunas disputas.
Na actual conjuntura de inadiáveis reformas estruturais que num primeiro tempo dificilmente dispensarão mais desemprego e menos dinheiro para os do costume, trabalhadores e classes médias, a maioria absoluta do PS é a única alternativa relativamente segura a novas eleições, a curto prazo, e a um Governo de coligação da direita com um PSD desembaraçado de Pedro Santana Lopes.
O desejo do Manuel Correia de uma concertação dos partidos de esquerda, que repartisse por uma maior base social os benefícios da governação de um Governo do PS minoritário, fez sentido durante algum tempo, no passado, quando a vida política ainda não tinha tornado evidente a impraticabilidade de o PS e o PCP chegarem a acordos governativos firmes.
A realidade dos últimos 30 anos da 2ª República mostrou que, até há pouco, acordos de Governo entre o PS e o PCP não são concretizáveis. Mas a realidade muda. E cabe indagar agora se com Sócrates e Jerónimo de Sousa, a convergência é mais fácil do que antes com Guterres e Carvalhas, ou Soares e Cunhal. A mim não me parece impossível mas não me parece mais provável que antes.
Resta o Bloco de Esquerda. Parecem-me mais viáveis acordos de incidência governativa do PS com o BE mas avalio-os como de baixa probabilidade. O BE de momento o que mais quer é crescer. E, como diz o Tunes, "sujar as mãos na governação" é o pior caminho para lá chegar.
Naturalmente que PCP e BE vão-se disponibilizar, antes das eleições, em termos vagos, para acordos com um PS minoritário. Mas fá-lo-ão porque esse é o mais forte "argumento" de que dispôem para combater a inevitável tendência ao voto útil da esquerda no PS.
No presente momento face a esta constatação, o risco muiro elevado que mse corre é: PS em minoria é uma trampolim rápido para um governo de direita. Independente da posição de cada um face ao PS,não será de tentar (uma pessoa de esquerda "não aparelhada") dar o seu contributo para evitar mais esse deslize em breve do país para a direita? É "uma tormenta de consciência". A.Melo
Pessoalmente agradado pela vinda do Raimundo Narciso à discussão (um abraço fraterno para o RN) e sem prejuízo de um «pequeno» post que estou a preparar de modo a prosseguir a estimulante conversa com o João Tunes (agora alargada ao RN), devo esclarecer que não considero um «pecado democrático» o facto do PS «pedir» a maioria absoluta a essa etérea entidade chamada «eleitorado». Não escrevi isso em lado nenhum. As minhas duas ideias principais acerca do assunto são
1) Politicamente é mais relevante e reconfortante conseguir uma MA em resultado de uma dinâmica de mérito e persuasão (propostas claras e entusiasmo correspondente) do que esperar que tal resultado decorra do pedido formulado. Pense-se na noite de 20 e no amanhecer de 21 e calcule-se os discursos possíveis. Se as coisas correrem bem, mas abaixo da fasquia (tão) alta, imagine-se a «falsa partida» psicológica e política. Qualquer coisa do género «Pedimos, mas esse tal eleitorado, não nos ouviu»? Esta mania de primeiro pedir a MA e depois mostrar o Programa Eleitoral pode parecer «natural» aos prosélitos, admito. Não deixa de ser democraticamente estranha.
2) Se alguns democratas deixarem de se contentar com os votos que merecem e desenvolverem «à outrance» a tese de que o país não é governável senão com MA's, não estarão eles a cair no logro da «chantagem», tentando forçar psicologicamente em vez de convencer politicamente? Eu, é claro, acho que sim.
Quanto à esquerda - ou às esquerdas - vi muito que não julgava possível (homem de pouca fé que sou) e vejo desenharem-se sinais de mudança, não dentro das organizações partidárias, mas na relação entre elas e na tensão com os eleitorados. Que os dois últimos governos da direita foram um desastre, está praticamente adquirido. O capital de esperança que as esquerdas merecerem em Fevereiro e em Outubro é muito importante para se passar a viver a política de uma forma mais séria e participada e menos como as intermináveis «claques» em que os discursos se resumem a assobios da bancada.
Podemos também não querer saber disto para nada e assobiar para o lado.
Ao anónimo anterior, cujos deslizes ortográficos me fazem lembrar um texto não muito distante, perguntarei apenas se acha curial a posição do PS quando pede a MA (para governar, é claro) antes de divulgar o programa eleitoral. Acho que se trata de uma confusão. É um palavreado admissível no plano da confiança e da intimidade partidária dos membros do PS (não seguramente de todos), mas completamente inadequado para quem (como muitos de nós) querem avaliar as propostas que o PS ainda não tornou públicas. Assim, protesto: isto não é «assobiar para o ar». É querer participar, com o mínimo de lucidez nas escolhas.
Quanto ao tema da MA, o tema leva muito mais longe. Daqui a uns anos (espero que não muitos) poderemos sorrir ao tentar compaginar os desejos piosos de maior participação dos cidadãos, por um lado e, por outro, verificar a tentação autocrática de resolver as contradições sociais e políticas concentrando toda a capacidade de decisão numa única força partidária. Quem viver sorrirá ou rirá a bom rir.
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