2004-06-08
Alternativas de Teodora Cardoso no JN
O artigo de opinião Alternativas de Teodora Cardoso no Jornal de Negócios de hoje merece toda a nossa atenção porque nos transporta para a realidade sueca em que foram dados passos significativos para blindar a economia dos ciclos eleitorais. Precisamos em Portugal destas condições nas relações Governo/Oposição quase "como do pão para a boca".
Vejamos o artigo que transcrevemos na íntegra:
"O governo tem boas razões para estar preocupado com a política económica que delineou e pôs em prática, cujo êxito dependia crucialmente de uma forte e rápida retoma internacional, que lhe permitiria fazer o contraste entre a «miséria» herdada e a pujança que esperava em breve poder anunciar. Para acentuar a diferença, pintou o mais negro quadro da herança e precipitou o País na depressão económica e psicológica, não hesitando mesmo em lançar sobre toda uma categoria profissional - a dos funcionários públicos - o labéu de negligência e incompetência, que estende, aliás, com vigor crescente, a todos os que se atrevam a questionar a presciência e inevitabilidade da sua política.
Quanto à presciência, o evoluir da situação fala por si. E não adianta a desculpa de que o problema é da conjuntura internacional, já que Portugal revela um desempenho inferior ao de qualquer país europeu. No que respeita à inevitabilidade, a questão é ainda mais clara. Para começar, não existem políticas sem alternativas. Mesmo as mais bem sucedidas precisam de ser constantemente criticadas e avaliadas à luz de alternativas, quer respeitantes a aperfeiçoamentos pontuais, quer a diferentes opções de fundo. Por maioria de razão, quando os resultados são maus, só um regime autoritário pode recusar discutir opções. Sabendo isso, o governo refugia-se na alegada incompetência da oposição para justificar atitudes cada vez menos compatíveis com um regime democrático.
Ora é certo que a oposição em Portugal – esteja ela a cargo do PS, do PSD ou de qualquer outro partido – não dispõe de condições adequadas à apresentação de políticas alternativas, a não ser em questões pontuais, ou num plano fundamentalmente ideológico, raramente podendo explicitar as medidas concretas e a relação custos / benefícios que tais alternativas comportariam. Isto está, aliás, na base das promessas não cumpridas, que vão crescentemente minando a credibilidade dos políticos.
Também nesta matéria, porém, existem alternativas e começa a ser indispensável e urgente que os políticos portugueses as estudem e discutam. Relativamente a questões orçamentais – mas extensivo a outras matérias – proponho desde já um método, inspirado no usado na Suécia. Consiste ele, emprimeiro lugar, em não permitir a introdução de alterações pontuais às propostas do governo. A proposta global de orçamento, incluindo os limites às despesas e as medidas fiscais, deve ser tratada como um todo e qualquer alteração que a oposição pretenda introduzir / discutir só pode ser admitida se incorporada numa proposta global alternativa.
É claro que, num sistema democrático, um tal princípio só é aceitável se os partidos da oposição tiverem acesso ameios que lhes permitam elaborar tais propostas. É exactamente o que sucede na Suécia, onde esses partidos podem utilizar os mesmos meios à disposição do governo com vista a apresentar as suas próprias políticas. Assim, os partidos da oposição solicitam ao Instituto de Conjuntura cenários macroeconómicos alternativos, incorporando as hipóteses que preferem, e utilizam o modelo de elaboração do orçamento à disposição do governo para produzirem as suas próprias versões. O gabinete técnico de apoio ao Parlamento (com cerca de trinta elementos) e o secretariado da Comissão de Finanças têm acesso a toda a informação necessária e são responsáveis pelo trabalho técnico indispensável.
Deste modo, a discussão no Parlamento incide sobre a análise das diferentes propostas globais de orçamento, o que, além da transparência e do óbvio carácter pedagógico do exercício, tem a vantagem de viabilizar governos de minoria (habituais na Suécia, cujo espectro partidário não é muito diferente do português), na medida em que este procedimento exige que a oposição se entenda quanto a um projecto global de orçamento, não bastando acordos relativos a medidas populares.
Um outro resultado deste método de trabalho – que é simultaneamente uma condição do seu êxito – reside na independência da administração pública, cuja missão consiste em pôr em prática as políticas aprovadas pelo Parlamento, a quem fornece a informação e o trabalho necessários, não se transformando em instrumento do(s) partido(s) do governo e menos ainda podendo ser usada para ocultar informação aos partidos da oposição.
As condições de trabalho da oposição no Parlamento sueco incluem ainda o financiamento de apoio técnico-político aos deputados (à razão de um assessor por cada dois deputados, equivalendo a um subsídio parlamentar de cerca de 4000 euros por mês e por assessor) e, além da subvenção em função do número de deputados, um suprimento fixo anual (de aproximadamente 370 mil euros) a cada grupo parlamentar da oposição duplo do recebido pelo grupo que representa o governo.
Quando o Parlamento português se dotar desta lógica de funcionamento, poderemos esperar uma política económica menos subordinada aos ciclos eleitorais, uma oposição e um eleitorado mais informados e mais criteriosos e também menos oportunidades para o insulto pessoal cujo único resultado é o descrédito da classe política e da democracia".
inserido 8/06
Vejamos o artigo que transcrevemos na íntegra:
"O governo tem boas razões para estar preocupado com a política económica que delineou e pôs em prática, cujo êxito dependia crucialmente de uma forte e rápida retoma internacional, que lhe permitiria fazer o contraste entre a «miséria» herdada e a pujança que esperava em breve poder anunciar. Para acentuar a diferença, pintou o mais negro quadro da herança e precipitou o País na depressão económica e psicológica, não hesitando mesmo em lançar sobre toda uma categoria profissional - a dos funcionários públicos - o labéu de negligência e incompetência, que estende, aliás, com vigor crescente, a todos os que se atrevam a questionar a presciência e inevitabilidade da sua política.
Quanto à presciência, o evoluir da situação fala por si. E não adianta a desculpa de que o problema é da conjuntura internacional, já que Portugal revela um desempenho inferior ao de qualquer país europeu. No que respeita à inevitabilidade, a questão é ainda mais clara. Para começar, não existem políticas sem alternativas. Mesmo as mais bem sucedidas precisam de ser constantemente criticadas e avaliadas à luz de alternativas, quer respeitantes a aperfeiçoamentos pontuais, quer a diferentes opções de fundo. Por maioria de razão, quando os resultados são maus, só um regime autoritário pode recusar discutir opções. Sabendo isso, o governo refugia-se na alegada incompetência da oposição para justificar atitudes cada vez menos compatíveis com um regime democrático.
Ora é certo que a oposição em Portugal – esteja ela a cargo do PS, do PSD ou de qualquer outro partido – não dispõe de condições adequadas à apresentação de políticas alternativas, a não ser em questões pontuais, ou num plano fundamentalmente ideológico, raramente podendo explicitar as medidas concretas e a relação custos / benefícios que tais alternativas comportariam. Isto está, aliás, na base das promessas não cumpridas, que vão crescentemente minando a credibilidade dos políticos.
Também nesta matéria, porém, existem alternativas e começa a ser indispensável e urgente que os políticos portugueses as estudem e discutam. Relativamente a questões orçamentais – mas extensivo a outras matérias – proponho desde já um método, inspirado no usado na Suécia. Consiste ele, emprimeiro lugar, em não permitir a introdução de alterações pontuais às propostas do governo. A proposta global de orçamento, incluindo os limites às despesas e as medidas fiscais, deve ser tratada como um todo e qualquer alteração que a oposição pretenda introduzir / discutir só pode ser admitida se incorporada numa proposta global alternativa.
É claro que, num sistema democrático, um tal princípio só é aceitável se os partidos da oposição tiverem acesso ameios que lhes permitam elaborar tais propostas. É exactamente o que sucede na Suécia, onde esses partidos podem utilizar os mesmos meios à disposição do governo com vista a apresentar as suas próprias políticas. Assim, os partidos da oposição solicitam ao Instituto de Conjuntura cenários macroeconómicos alternativos, incorporando as hipóteses que preferem, e utilizam o modelo de elaboração do orçamento à disposição do governo para produzirem as suas próprias versões. O gabinete técnico de apoio ao Parlamento (com cerca de trinta elementos) e o secretariado da Comissão de Finanças têm acesso a toda a informação necessária e são responsáveis pelo trabalho técnico indispensável.
Deste modo, a discussão no Parlamento incide sobre a análise das diferentes propostas globais de orçamento, o que, além da transparência e do óbvio carácter pedagógico do exercício, tem a vantagem de viabilizar governos de minoria (habituais na Suécia, cujo espectro partidário não é muito diferente do português), na medida em que este procedimento exige que a oposição se entenda quanto a um projecto global de orçamento, não bastando acordos relativos a medidas populares.
Um outro resultado deste método de trabalho – que é simultaneamente uma condição do seu êxito – reside na independência da administração pública, cuja missão consiste em pôr em prática as políticas aprovadas pelo Parlamento, a quem fornece a informação e o trabalho necessários, não se transformando em instrumento do(s) partido(s) do governo e menos ainda podendo ser usada para ocultar informação aos partidos da oposição.
As condições de trabalho da oposição no Parlamento sueco incluem ainda o financiamento de apoio técnico-político aos deputados (à razão de um assessor por cada dois deputados, equivalendo a um subsídio parlamentar de cerca de 4000 euros por mês e por assessor) e, além da subvenção em função do número de deputados, um suprimento fixo anual (de aproximadamente 370 mil euros) a cada grupo parlamentar da oposição duplo do recebido pelo grupo que representa o governo.
Quando o Parlamento português se dotar desta lógica de funcionamento, poderemos esperar uma política económica menos subordinada aos ciclos eleitorais, uma oposição e um eleitorado mais informados e mais criteriosos e também menos oportunidades para o insulto pessoal cujo único resultado é o descrédito da classe política e da democracia".
inserido 8/06