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2004-08-19

 

Relativizando as Ideias (II)

Com o meu anterior post sobre Angola apenas comecei a questionar umas tantas "ideias feitas", como aquela tese niilista de que África é um caso perdido.

Penso não estar perante um caso de optimismo militante!(um abraço ao João Tunes o autor deste comment), pois não voltei nem mais nem menos optimista. Voltei com dúvidas sobre algumas/muitas das leituras que ouvia/continuo a ouvir da realidade africana e angolana neste caso e, sobretudo, dos desafios exigentes ideológico-teóricos que se colocam para mexer/mudar situações tão complexas.

De uma forma geral, diz-se /constata-se que a grande maioria dos países de África estão mal governados. Sobre isso não há dúvidas e também que é deveras contrastante a potencial riqueza natural de muitos dos países e a miséria dos seus povos que, na região subsariana, obriga a que metade da população tenha de sobreviver com menos de um dólar por dia.

Mas existem questões novas, específicas, (para além das mais globais a nível dos jogos e interesses mundiais) pelo menos pelo ritmo assumido no seu desenvolvimento, a exigir respostas inovadoras. Angola, por exemplo, deverá ser umas das zonas do mundo com uma das taxas de urbanização mais rápidas, motivada pela deslocação das pessoas para os centros urbanos em fuga à guerra. De acordo com as estimativas correntes, em 50 anos, a percentagem da população urbana passou de 6% para mais de 60%. Só Luanda estima-se ter 4,5 milhões de pessoas para uma população global também estimada em 14,2 Milhões (2002).

Se a esta realidade se aliar o rápido crescimento populacional(há a referir que a taxa de fecundidade global é 7,1 crianças por mulher) surge-nos um leque de problemas de muito difícil solução.

Desde logo a elevada taxa de dependência juvenil, ao contrário do que se passa nos páises desenvolvidos em que esta taxa se relaciona com as pessoas idosas e tendências para práticas não consentidas como o trabalho infantil.

Por outro, em termos de políticas, como conciliar objectivos de desenvolvimento rural com a situação de uma sociedade urbana e que, por muito mais incentivos que se criem para se fixar as pessoas ao meio rural, a situação tornou-se em grande parte irreversível, isto apesar de no momento presente ainda não estarem criadas as condições de "reassentamento" das pessoas por causa das minas.

São questões deste melindre que, não desculpando a má gestão política das sociedades por muito do seu atraso, designadamente em termos de desperdício ou má aplicação de potenciais recursos naturais, nos fazem contudo pensar, até porque nem estão encontradas, em muitos casos, as soluções, ao nível académico, para estas situações criadas. (Os elementos estatísticos aqui mencionados têm por fonte o relatório "Angola os desafios do pós guerra: Avaliação Conjunta do País 2002 Sistema das Nações Unidas em Angola)
Comments:
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Leio o que escreveste com sofreguidão e, confesso, um tanto impacientemente. Murmuro: quando começará ele a falar do ambiente político, da cultura, e por aí fora.
Mas acho a introdução bem feita, serena e prometedora.
Cá fico, de olhos no blog, roendo as unhas...
 
Com toda a franqueza estão a suscitar-me curiosidade os seus post sobre Angola. Como diz o comentarista anterior sinto-me algo atraída pelo que venha a dizer sobre o estado da cultura angolana, embora não seja tão exigente como ele pois reconheço que uma pessoa pode não querer abordar o que eu gostaria.
Acho porém que já nos sugeriu umas pistas, pelo menos como curiosa da realidade africana e de Angola em particular, pelo que espero mais uns posts. Tomei nota entre outras da ideia subjacente que apreciei de que as ideias devem ser relativizadas.
Clara Fonseca
 
Não sei se se apercebeu, mas Luanda é uma cidade muito cara, mais cara que a maioria das europeias para um estrangeiro que queira ter uma vida normal. O hotel é caríssimo, por exemplo o Alvalade ou o Trópico custa por dia 160 USD, uma refeição raramente nos fica por menos de 25 euros e dificilmente percebi como era possível a uma massa enorme de angolanos frequentarem os mesmos restaurantes que eu. Interroguei-me pois trabalho numa empresa francesa e nessa qualidade estive lá dois meses, relativamente bem remunerado e mesmo assim tinha de ter alguma contenção. Daí concordar consigo que temos de relativizar a nossa apreciação, pois quando para lá parti, encarava Angola com tendo uma elite com poder financeiro que até pouco se via e o resto um conjunto de pobretanas. fiquei chocada pela positiva, por a minha realidade não ser a realidade de Luanda. Há uma vasto segmento com muito poder de consumo.
 
Concordo totalmente com o texto e, também, com o ultimo comentário. De acordo com estudos recentes, ocorreu o seguinte em Angola: 20% da população mais "rica" viu crescer substancialmente os seus rendimentos à custa dos 20% mais pobres. Este sistema de "vasos comunicantes" beneficia cerca de 3 milhões de pessoas e não apenas o Presidente Eduardo dos Santos. Enquanto não se perceberem as implicações políticas destes números não se percebe o que se passa em Angola. Já agora interessa também perceber que os 3 milhões de despojados (os tais 20% mais pobres) não têm voz, não têm influência política e, tanto sei, não estão "representados" no sistema político angolano.
 
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