2005-04-23
Igreja quer Estado Confessional em Timor Leste
Uma - O Governo recuava e anulava a decisão (passar de obrigatória a facultativa a disciplina de Religião no ensino público) que está na origem desta última movimentação da Igreja contra o Governo.
Com a primeira o Bispo Ximenes Belo punha-se ao lado da Igreja, contrariando a Constituição que prevê a separação entre o Estado e as religiões e derrotava o Governo democraticamente eleito. Com a segunda o prémio Nobel fazia o contrário. Punha-se do lado do Estado de Direito e derrotava a conspiração do clero.
Porque, na realidade a Igreja em Timor Leste não quer saber de uma qualquer disciplina de Moral ou Ética, quer é o ensino da religião católica obrigatória na escola pública que lhe permita manter e aumentar o controle espiritual (e com ele o temporal) da população.
Do jornal Público de 2005-04-20
http://jornal.publico.clix.pt/noticias.asp?a=2005&m=04&d=20&uid=&id=16647&sid=1827
"O primeiro-ministro, Mari Alkatiri, está a ser acusado [pela Igreja] de liderar um regime ditatorial por pretender fazer da Religião uma disciplina facultativa e com menor carga horária nas escolas timorenses. Os cerca de cinco mil manifestantes que ontem se reuniram na Avenida dos Direitos Humanos, em Díli, não gritavam palavras de ordem nem exibiam cartazes. Carregando imagens de Nossa Senhora, rezavam o terço e ouviam as palavras de vários líderes religiosos que organizaram o protesto. "Combatemos o regime ditatorial de Alkatiri", afirmou à multidão o porta-voz da Diocese de Díli, padre Benâncio Araújo, citado pela AFP. O padre apelou a outros membros da Igreja a organizar manifestações para "derrubar o regime antidemocrático"
"o Governo está pronto a abrir o diálogo com a Igreja Católica mas a manifestação não facilita a criação de condições para o diálogo".
"É possível que os protestos se alarguem ainda mais, a julgar pelas projecções da Igreja, que encomendou o fabrico de 30 mil camisolas para distribuir aos manifestantes. O conflito leva já dois meses, recordava ontem a Lusa. A 21 de Fevereiro, uma primeira nota episcopal criticava o projecto do Governo de Alkatiri de, durante um ano lectivo, a cadeira de Religião deixar de ter o actual peso curricular e passar a ser facultativa. O programa seria aplicado a título experimental e apenas em 32 escolas.Um mês depois, o núncio apostólico, Malcolm Raamjiph, desloca-se a Díli e encoraja os timorenses a "confrontarem os que tentam destruir a Igreja".
O Governo reage, afirmando que o núncio apostólico estava a tecer "acusações belicosas" e a exercer "uma indesejável interferência nos assuntos internos de Timor-Leste", lia-se num comunicado assinado pelo chefe da diplomacia timorense, José Ramos-Horta.
Mais tarde, o Executivo acusou os bispos D. Alberto Ricardo da Silva, de Díli, e D. Basílio do Nascimento, de Bacau, de se quererem substituir à oposição timorense. "A Igreja sente-se pequena na sua função evangelizadora", disse então Alkatiri.
Cerca de 90 por cento dos timorenses dizem-se católicos. Mas em 2001 elegeram para chefe do Governo um muçulmano, Mari Bin Amude Alkatiri, descendente de emigrantes iemenitas. Quando, nas legislativas de há três anos, Mari Alkatiri foi eleito, muitos à sua volta consideravam-no "casmurro, íntegro e convicto", segundo a descrição do então correspondente da Lusa, António Sampaio. Enquanto ministro-chefe no segundo governo transitório, Alkatiri consolidou a imagem de líder. Os timorenses também conheciam as suas batalhas contra a discriminação religiosa. Mas era claro que nem todos os timorenses apreciavam o facto de ter um muçulmano a governar um país católico (a evangelização começou nos finais do século XVI com missionários dominicanos). Sete meses depois de ser eleito, o primeiro-ministro foi alvo de violentas manifestações - as mais violentas desde a independência. Os revoltosos incendiaram então vários edifícios governamentais de Díli, bem como as casas do próprio Alkatiri e de dois dos seus irmãos. A violência diminuiu. Mas o fosso entre o Governo e a Igreja Católica está a crescer, como ilustram os recentes protestos.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DEMOCRÁTICA DETIMOR-LESTE
Artigo 45.º
(Liberdade de consciência, de religião e de culto)
1. A toda a pessoa é assegurada a liberdade de consciência, de religião e de culto, encontrando-se as confissões religiosas separadas do Estado. [sublinhado de RN]
2. Ninguém pode ser perseguido nem discriminado por causa das suas convicções religiosas.
3. É garantida a objecção de consciência, nos termos da lei.
4. É garantida a liberdade do ensino de qualquer religião no âmbito da respectiva confissão
religiosa.
(In http://pascal.iseg.utl.pt/~cesa/Constituicao%20Timor%20Leste.pdf)
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