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2005-09-28

 

Juizes ameaçam com greve (2)

O funcionamento da Justiça em Portugal é mau. É muito mau. É demasiado mau. Por um lado a demora. A demora é tal que a Justiça impede a justiça e tornou-se não apenas fonte de indignação e desespero para os cidadãos como um dos constrangimentos mais decisivos na nossa economia. Mas não é, obviamente, só a demora. É também o descrédito. Descrédito generalizado. O vulgar cidadão acha que a Justiça está ao serviço dos ricos e poderosos e só marginalmente e ao acaso da sorte de quem não tem nem poder nem dinheiro. A opinião corrente é a de que a "Justiça" apenas está ao alcance de quem tem dinheiro para bons advogados, para corromper e comprar quem a administra ou para conquistar a sua cumplicidade. Para "confirmar" tais presunções muito generalizadas aí estão muitos e controversos episódios do julgamento da Casa Pia, do Apito Dourado, da ostensiva impunidade política de Ferreira Torres, Valentim Loureiro, Fátima Felgueiras, do ostentatório enriquecimento de tanta gente que só pode ter origem criminosa mas que ninguém imagina sequer que possa vir a ser incomodada. Difunde-se, ainda que desproporcionadamente, a convicção de que redes e poderes encobertos agem transversalmente através de partidos e órgãos de soberania para garantir o enriquecimento e a impunidade.
A culpa é só dos juizes, magistrados do Ministério Público, dos advogados? Obviamente que não. Reparte-se pela classe política, pelos outros órgãos de soberania que cedem ou não conseguem opor-se a poderosos grupos de pressão. E, como em todos os grupos de cidadãos, não se podem generalizar condutas e posições.
Se visse os juizes e magistrados do ministério público numa prova de força pela superação vigorosa deste estado de coisas compreendia. E apoiava.
Mas sendo entre os portugueses remunerados pelo Estado um dos grupos mais bem pagos e que mais regalias usufrui, ameaçarem alguns deles com greves porque o Governo perante extrema necessidade nacional de diminuir despesas decidiu não os deixar de fora do esforço de austeridade é algo para que alguns senhores magistrados não devem ter a esperança de conquistar o coração dos cidadãos.
A tal ponto que Sarsfield Cabral concluiu no Diário de Notícias que "as contestações corporativas são uma bênção para o Governo".

Comments:
O Sarsfield Cabral saberá do que fala. Acho que contestação a um governo, forte ou fraca, é sempre o oposto a apoio a um governo. Avaliar as contestações é o que importa a quem tem os seus credos e causas bem definidos. Minimizá-las pode ser fatal (além, é claro, de um exercício assimilável à incompetência política). Convém começar a procurar, com seriedade, identificar quem apoia o Governo nas medidas em que retira direitos adquiridos aos que os conquistaram graças à revolução do 25 de Abril. Esse cômputo será, porventura, elucidativo...
Sejamos claros. Quem é que defende a justiça de modificar as regras a meio do jogo? Até a duração dos mandatos políticos remete para 2012. Porquê afrontar as expectativas de tantas gentes?

Parece, agora, que poderei deduzir, outra vez, o meu PPR no IRS. Só falta saber em que termos... Era um direito que tinha e do qual Barroso, Santana e Félix me esbulharam. Terei de aguardar pelo próximo ciclo da direita para recuperar aqueles direitos de que o PS agora me priva. Nesse caso, viva a alternância!

Ana Alçada
 
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