2006-01-25
Tirar lições da derrota
O PS poderá muito bem assobiar para o lado e tentar sacudir a água do capote, no entanto, vá por mim (conhecimentos obtidos por benchmarking!). Escamotear a realidade não costuma ajudar.
Naturalmente a primeira lição a tirar é que mal Sócrates chegou a secretário-geral em 25 de Setembro de 2004 ficou com uma responsabilidade sobre os ombros: encontrar rapidamente um candidato a PR. E rapidamente porque o PSD e a direita em geral já tinha um, Cavaco Silva, que há vários anos vinha fazendo caminho e campanha. Uma parte dos analistas, nomeadamente aqui no Puxapalavra, considera que o protelamento de uma escolha se deve à conformação de Sócrates com o candidato do PSD. A minha explicação, mas com fundamentos tão especulativos como aquela, é a de que se foi fiando na hipótese vaga do seu amigo Guterres acabar por aceitar candidatar-se.
Sem candidato era necessário criar um com capacidade de ganhar. Isso era possível em 2004 e mesmo nos primeiros meses de 2005. Mas em Agosto ou Setembro de 2005 não era possível.
Aliás manifestei a minha apreensão [aqui ] a sete meses das eleições para a PR, num post com a propiciatória data de 13 de Maio.
À escolha de Mário Soares, que aliás também sugeri, como recurso, no mês seguinte juntou-se a trapalhada com o convite-não convite a Manuel Alegre.
Mantenho a convicção de que Alegre não seria nunca um candidato capaz de ganhar a Cavaco Silva porque ambos iriam disputar o centro e este não votaria em Manuel Alegre.
Mas o mais importante é saber ler a surpreendente votação de Alegre.
Há seguramente muitos factores mas não será fácil quantificá-los.
* Há a vitimização. Prometeram! Soares ou o PS ou os dois que o apoiavam e depois "traíram-no". Não interessa saber se é assim ou não. Esta foi uma "realidade" que fez o seu caminho.
* Há os que não gostam de Soares, do soarismo, do clã Soares. Por múltiplas razões. Razões aceitáveis e também falsas razões bebidas durante anos no PCP e outras áreas da esquerda.
* Há o desagrado de alguns eleitores socialistas com a política do Governo, nomeadamente funcionários públicos por perda de regalias.
* Há os que estão contra a numenclatura do PS, porque os "tachos" e "tachinhos"vão sempre para os mesmos e não os contemplam.
* Há os que estão contra as práticas aparelhistas. Contra o "aparelho" do PS, contra a corrupção, contra o favoritismo, contra acordos tácitos dos "jobs for the boys" do bloco central.
* Há os que acham que Sócrates é da ala direita do PS e eles são da ala esquerda, mesmo sem terem programa político alternativo viável na actual conjuntura.
* Há os que estão contra os partidos, ou contra os "aparelhos" em geral e estão sempre disponíveis para a primeira quimera que apareça, mesmo sem a menor consistência, sem avaliar nem querer saber das alternativas (piores) e contentando-se com o seu quixotismo.
Manuel Alegre teve um mérito. Não tendo conseguido um aparelho apresentou-se como um candidato contra os aparelhos. E julgo que não forçou em momento nenhum a sua consciência. Porque ele, um verdadeiro produto e vitalício usufrutuário de aparelho, nutriu sinceramente sempre, ao que consta no PS, um real desprezo pelos aparelhos. Teve o mérito de pôr a descoberto uma realidade. Uma realidade mensurável pela sua votação. E que hoje é uma realidade para além dele. Muito etérea é certo, mas com dinâmica própria.
Comments:
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Há duas eças que não encaixam lá muito bem no puzzle deste teu poste. Uma tem a ver com a benevolência crítica relativamente a uma direcção partidária que se teria baseado na esperança de Guterres, estando a dizer sempre que não, poder vir a dizer que sim. No plano da análise e da planificação política deste novo século. Sondar Alegre e acabar por escolher Soares, releva de um anti-maquiavelismo absurdo, porque desprotege o «príncipe» retirando-lhe, à medida que o tempo passa, o poder de escolha. Um candidato ganhador não poderia apenas agradar ao PS. Onde a direcção do PS (suponho que não apenas Sócrates) teve uma conduta suicidária, tu, com a tua (nestes casos) proverbial generosidade, atendes e compreendes. É legitimamente estranho.
A outra peça que não encaixa é a das ideias anti-Soares. O PCP, desta vez e de outras vezes, sempre que viu o caldo entornado, votou Soares. Tapando-lhe a cara, engolindo elefantes, escolhendo o mal menor, - o que se quiser. Jerónimo admitiu votar Soares na 2ª Volta; Saramago declarou publicamente que tinha um candidato para a 1ª volta e outro para a 2ª (era o Soares, é claro). Enganaram-se. Não houve 2ª volta. Mas pelas adesões do passado e pelo que prometiam no presente, lá estavam a garantir que o apoiariam, incorrendo numa apreciação tão deficiente como a que se traduziu na infundada confiança Sócrates em Guterres. Aí, a tua generosidade, legitimamente, esboroa-se.
OK.
Porque não aceitarmos a hipótese (timidamente o formulo...) de que Soares teve o seu tempo e que esquecer que o tempo passa é um erro que nos coloca fora do tempo?
Haverá sempre gentes dispostas a votar nele, - tu, o Mário Bettencourt Resendes, (que escreve um artigo delicioso no DN de hoje a esse respeito), o Saramago, o Jerónimo, muitos comunistas - mas, como sabes, não chega. São necessários muitos mais votos, mais política, mais entusiasmo.
O juízo dos eleitores vai-se despartidarizando, logo, os partidos (o PS e o PCP, neste caso) deviam estar atentos e tentar responder à altura. O caso de Alegre, pessimamente resolvido pelo PS, veio revelar algo que todos já sabíamos mas alguns de nós não querem ainda ver: os espaços de participação fora das lágicas meramente partidárias. Não falo de aparelhos, nem do passado dos candidatos, nem da perversão das estratégias. Digo, simplesmente, que embora me agrade muito o cimento plutipartidário que sustenta a nossa democracia, há uma espécie de espaço público alternativo que, se soubermos jogar bem, poderá contribuir para o seu reforço. Se jogarmos mal, não. Acontece um 22 de Janeiro qualquer...
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Há duas eças que não encaixam lá muito bem no puzzle deste teu poste. Uma tem a ver com a benevolência crítica relativamente a uma direcção partidária que se teria baseado na esperança de Guterres, estando a dizer sempre que não, poder vir a dizer que sim. No plano da análise e da planificação política deste novo século. Sondar Alegre e acabar por escolher Soares, releva de um anti-maquiavelismo absurdo, porque desprotege o «príncipe» retirando-lhe, à medida que o tempo passa, o poder de escolha. Um candidato ganhador não poderia apenas agradar ao PS. Onde a direcção do PS (suponho que não apenas Sócrates) teve uma conduta suicidária, tu, com a tua (nestes casos) proverbial generosidade, atendes e compreendes. É legitimamente estranho.
A outra peça que não encaixa é a das ideias anti-Soares. O PCP, desta vez e de outras vezes, sempre que viu o caldo entornado, votou Soares. Tapando-lhe a cara, engolindo elefantes, escolhendo o mal menor, - o que se quiser. Jerónimo admitiu votar Soares na 2ª Volta; Saramago declarou publicamente que tinha um candidato para a 1ª volta e outro para a 2ª (era o Soares, é claro). Enganaram-se. Não houve 2ª volta. Mas pelas adesões do passado e pelo que prometiam no presente, lá estavam a garantir que o apoiariam, incorrendo numa apreciação tão deficiente como a que se traduziu na infundada confiança Sócrates em Guterres. Aí, a tua generosidade, legitimamente, esboroa-se.
OK.
Porque não aceitarmos a hipótese (timidamente o formulo...) de que Soares teve o seu tempo e que esquecer que o tempo passa é um erro que nos coloca fora do tempo?
Haverá sempre gentes dispostas a votar nele, - tu, o Mário Bettencourt Resendes, (que escreve um artigo delicioso no DN de hoje a esse respeito), o Saramago, o Jerónimo, muitos comunistas - mas, como sabes, não chega. São necessários muitos mais votos, mais política, mais entusiasmo.
O juízo dos eleitores vai-se despartidarizando, logo, os partidos (o PS e o PCP, neste caso) deviam estar atentos e tentar responder à altura. O caso de Alegre, pessimamente resolvido pelo PS, veio revelar algo que todos já sabíamos mas alguns de nós não querem ainda ver: os espaços de participação fora das lágicas meramente partidárias. Não falo de aparelhos, nem do passado dos candidatos, nem da perversão das estratégias. Digo, simplesmente, que embora me agrade muito o cimento plutipartidário que sustenta a nossa democracia, há uma espécie de espaço público alternativo que, se soubermos jogar bem, poderá contribuir para o seu reforço. Se jogarmos mal, não. Acontece um 22 de Janeiro qualquer...
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