2006-08-29
A desumanização da política (6)
Não estamos bem uns para os outros!
A prosa de Vital Moreira no PÚBLICO de hoje (pág. 6) -- "Partidos e eleitos partidários" [tb. disponível aqui] -- merece ser reflectida a mais do que um título. A par de considerações genéricas, de carácter técnico e político, acerca do funcionamento do sistema autárquico, com as quais, em geral, concordo, desvaloriza a importância do que se passou em Setúbal, utilizando uma expressão curiosa
« (…) a aceitação acrítica da censura partidária pelo ex-presidente é tanto ou mais criticável. Tanto um [ o PCP] como outro [Carlos Sousa] deviam explicações aos eleitores. Ambos falharam redondamente. Estão bem um para o outro.»
Este juízo sumário é inconsistente.
Em primeiro lugar porque, mantido, embora, o aparente respeito pelo “centralismo democrático”, o ex-presidente da Câmara de Setúbal anunciou, alto e em bom som, que discordava da decisão, dos fundamentos anunciados, e da apreciação acerca do défice de ânimo e motivação que lhe imputaram.
A questão não está, portanto, em se ter conformado com a decisão dos seus camaradas, mas na sua opção de trazer a público uma discrepância cuja lógica nos escapa. Onde outros, também legitimamente, silenciam, Carlos Sousa, nos limites da coerência estatutária, deu a entender que, de outro modo, não teria quebrado o compromisso eleitoral que assumiu, derivado dos últimos resultados eleitorais.
« (…) a aceitação acrítica da censura partidária pelo ex-presidente é tanto ou mais criticável. Tanto um [ o PCP] como outro [Carlos Sousa] deviam explicações aos eleitores. Ambos falharam redondamente. Estão bem um para o outro.»
Este juízo sumário é inconsistente.
Em primeiro lugar porque, mantido, embora, o aparente respeito pelo “centralismo democrático”, o ex-presidente da Câmara de Setúbal anunciou, alto e em bom som, que discordava da decisão, dos fundamentos anunciados, e da apreciação acerca do défice de ânimo e motivação que lhe imputaram.
A questão não está, portanto, em se ter conformado com a decisão dos seus camaradas, mas na sua opção de trazer a público uma discrepância cuja lógica nos escapa. Onde outros, também legitimamente, silenciam, Carlos Sousa, nos limites da coerência estatutária, deu a entender que, de outro modo, não teria quebrado o compromisso eleitoral que assumiu, derivado dos últimos resultados eleitorais.
Ora eu acho que vale a pena discuti-la por isso mesmo.
Todas as forças políticas, num momento ou outro, passam por cima dos direitos individuais dos seus membros para fazer valer o que os seus dirigentes entendem por «bem comum» -- da força partidária, do país, da união, ou do mundo -- e creio que Vital Moreira também já passou por isso mais do que uma vez. A questão reside precisamente no sentido político dos actos e das decisões.
De umas vezes, as direcções políticas exercem os seus direitos de reserva através de figuras como quotas, homologações e ratificações; de outras, reconhecem a soberania paroquial para tratar questões do mesmo jaez. De umas vezes, aguardam o término dos mandatos e, avaliando a «prestação de contas», propõem afastamentos ou reconduções; de outras, intempestivamente, impõem a saída abrupta de uma pessoa eleita, extravasando para a esfera pública as lutas internas pelo poder.
Devemos à nossa fraca cultura política uma atenção crítica a estes sinais.
Como, neste caso, as saídas forçadas de Carlos Sousa e Aranha Figueiredo configuram precisamente um ajuste de contas interno à custa dos compromissos eleitorais que ambos, nas listas do PCP/CDU, assumiram, o escrutínio político da questão não deve deter-se na consideração imponderada de que «estão bem uns para os outros».
Sem cair em despropositados dramatismos, à falta de explicações, o imperativo democrático é buscá-las, descobri-las, exigi-las e avaliá-las. De outro modo, continuaremos, todos, demasiado bons uns para os outros.
Como, neste caso, as saídas forçadas de Carlos Sousa e Aranha Figueiredo configuram precisamente um ajuste de contas interno à custa dos compromissos eleitorais que ambos, nas listas do PCP/CDU, assumiram, o escrutínio político da questão não deve deter-se na consideração imponderada de que «estão bem uns para os outros».
Sem cair em despropositados dramatismos, à falta de explicações, o imperativo democrático é buscá-las, descobri-las, exigi-las e avaliá-las. De outro modo, continuaremos, todos, demasiado bons uns para os outros.
Comments:
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Carlos Sousa conteve-se nos seus comentários à posição do PCP. Se disse-se tudo, ficariamos todos a saber que Jerónimo, Casanova e Abrantes o afastaram por ser renovador. Mas isso é o que não se lê em lado nennhum...
Quanto a mim Carlos Sousa é mesmo um "servidor" do Partido e só tocará Trombone quando tiver um aliciante convinte de outra Força Partidária!
Netwalker: bastanta cínico e completamente infundamentado o seu comentário, não acha?
Bart Simpson: tanto quanto sei nem Jerónimo, Casanova e Abrantes pertencem à Concelhia de Setúbal. Foi esta quem tomou a decisão e a assumiu. Aliás, nas questões de poder local quem decide são as concelhias.
Bart Simpson: tanto quanto sei nem Jerónimo, Casanova e Abrantes pertencem à Concelhia de Setúbal. Foi esta quem tomou a decisão e a assumiu. Aliás, nas questões de poder local quem decide são as concelhias.
A Margarida tem toda a razão. O centralismo-democrático é mesmo assim. Cada concelhia decide pelas suas cabeças em total autonomia. Aposto que o Jerónimo só soube disto pelos jornais.
Não é verdade que Carlos Sousa alguma vez tenha sido um renovador dentro do PC. Ele sempre conviveu e subscreveu as medidas tomadas pelo partido noutras situações, e com outros protagonistas (ou vitimas?).
Recordo que quando concorreu à Câmara de Palmela e teve como adversário político pelo PS o ex-comunista e ex-Presidente da Região de Turismo Costa-Azul, o candidato da CDU referia-se ao segundo dizendo que se tratava de um traidor, vira-casacas e indisciplinado dentro das estruturas do partido a que pertencera durante muitos anos.
Mais tarde, e porque pensou que por algum motivo milagroso a ala renovadora comunista pudesse vir a ter maior peso dentro da organização partidária, assinou um, apenas um, abaixo-assinado promovido por estes.
Mas a prática de Carlos Sousa (fora do partido) sempre foi a do quero posso e mando, e dentro da organização sempre aceitou a "orientação" que, durante todo este tempo, lhe fora favorável. Ainda hoje, quando lhe perguntam certas coisas - para as quais não sabe, ou não convém dar resposta, recorre àquele tique orrivel de dizer que "foi visto", ou "foi decidido"...
Em Palmela Carlos Sousa apareceu como caído de para-quedas para ser o candidato à presidencia da Câmara à época ocupada (apenas há um mandato) por Carlos Pezinho. Nessa altura o então presidente caíra em desgraça dento da concelhia, maioritáriamente favorável a Carlos Sousa. Em Setúbal, esse estado de graça só durou um mandato e poucos meses para Carlos Sousa. É a vida!
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Recordo que quando concorreu à Câmara de Palmela e teve como adversário político pelo PS o ex-comunista e ex-Presidente da Região de Turismo Costa-Azul, o candidato da CDU referia-se ao segundo dizendo que se tratava de um traidor, vira-casacas e indisciplinado dentro das estruturas do partido a que pertencera durante muitos anos.
Mais tarde, e porque pensou que por algum motivo milagroso a ala renovadora comunista pudesse vir a ter maior peso dentro da organização partidária, assinou um, apenas um, abaixo-assinado promovido por estes.
Mas a prática de Carlos Sousa (fora do partido) sempre foi a do quero posso e mando, e dentro da organização sempre aceitou a "orientação" que, durante todo este tempo, lhe fora favorável. Ainda hoje, quando lhe perguntam certas coisas - para as quais não sabe, ou não convém dar resposta, recorre àquele tique orrivel de dizer que "foi visto", ou "foi decidido"...
Em Palmela Carlos Sousa apareceu como caído de para-quedas para ser o candidato à presidencia da Câmara à época ocupada (apenas há um mandato) por Carlos Pezinho. Nessa altura o então presidente caíra em desgraça dento da concelhia, maioritáriamente favorável a Carlos Sousa. Em Setúbal, esse estado de graça só durou um mandato e poucos meses para Carlos Sousa. É a vida!
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