2006-11-24
Jeronimismo (1)
Serei eu o que sobra?
Depois do “caso” Carlos Sousa, apeado intempestivamente da presidência da Câmara Municipal de Setúbal, segue-se o “dossier” Luísa Mesquita. Há os que justificam a medida, lembrando vingativamente a truculência ortodoxa da deputada. Posição fraca. A deputada do PCP merece, de qualquer maneira, a compreensão de quem não fica atrapalhado quando tem de escolher entre “direitos colectivos” e “direitos individuais”.
Será este um dos traços do “jeronimismo”?
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Porque talvez seja oportuno lembrar algumas coisinhas, trago para reflexão este artigo:
Tem a palavra o Professor
Artigo de Vítor Dias no "Semanário"
Sexta, 19 Abril 2002
Com a preciosa contribuição das «vítimas», graças ao maremoto de correspondentes comentários na generalidade da comunicação social e à ajuda de centenas de títulos sobre «expulsões» e «purgas» sempre iminentes, talvez não seja de admirar que boa parte da opinião pública esteja a receber a imagem do PCP como um partido onde não se tolerariam opiniões divergentes, onde se existiriam «delitos de opinião» que são sancionados e cuja vida interna decorreria debaixo de regras não apenas muito próprias mas também chocantemente autoritárias.
Porém, com graves prejuízos para a compreensão desta situação, praticamente ninguém explicou com detalhe que tenebrosas regras são essas cuja aplicação ou desejo de ver respeitadas estão por detrás da famosa «sanha persecutória» que percorreria o PCP.
É esse verdadeiro serviço público que hoje queremos prestar. De facto, as coisas só podiam ser como estão a ser num partido que, no artº 2º dos seus Estatutos, consagra «a liberdade de discussão e reconhecimento do pluralismo de opiniões» mas de imediato, em limitação de recorte estalinista, esclarece que isto é «dentro dos órgãos próprios do Partido», o que, como é bom de ver, inviabiliza a celebrada «circulação horizontal de informação» . E que, logo a seguir, num inaceitável ataque à liberdade de opinião e à individualidade dos seus membros, prescreve como principio da organização «o respeito por todos pelas decisões da maioria, tomadas segundo os presentes Estatutos». E que, ao descrever no artº 6º os direitos dos militantes, situa «no interior do Partido» o direito a «discutir livremente os problemas nacionais e internacionais».
De facto, as coisas não podiam ser diferentes num partido que, no seu Regulamento de Disciplina, elenca um pormenorizado e doentio conjunto de 15 infracções disciplinares.
Na verdade, nesse detestável Regulamento definem-se como infracções disciplinares dos militantes (passíveis de diversas sanções) coisas como (ler com atenção, por favor): o «tornar conhecidos, seja por que forma for, factos ou decisões referentes à vida interna do Partido e dos quais se tenha sabido no exercício de cargos, funções ou missões para que tenha sido designado»; a «defesa pública de posições contrárias aos princípios (...) do programa partidário»; o «manifesto desrespeito pelas deliberações emitidas pelos órgãos competentes do Partido, designadamente através dos órgãos de comunicação social»; a «inscrição em qualquer associação política não filiada no Partido» se feita sem conhecimento da direcção nacional do partido; a «participação», sem autorização dos órgãos nacionais, «em qualquer actividades susceptível de contrariar as directrizes dos competentes órgãos do Partido»; o «comportamento provadamente lesivo dos objectivos prosseguidos pelo Partido»; o «estabelecer polémica com outros membros do Partido fora dos quadros ou órgãos partidários desde que a discussão incida sobre deliberações dos respectivos órgãos estatutários e seja susceptível de pôr em causa a eficácia daquelas directrizes».
E, para terminar, só falta dizer que, com evidente incidência no mais recente «caso», aquele Regulamento de Disciplina vai ainda ao requinte de considerar como «circunstâncias agravantes» das 15 infracções disciplinares «a publicidade das faltas cometidas» e «ser o infractor titular de órgãos nacionais e regionais».
A quem aqui tenha conseguido chegar, está agora reservado um balde de água gelada ou, quem sabe, um suspiro de alívio. É que todas estas normas e regras aqui fastidiosamente reproduzidas não dizem respeito ao PCP mas – segurem-se! - aos Estatutos e ao Regulamento de Disciplina vigentes no PSD!.
Sendo ainda de acrescentar que são muito mais minuciosas e, consequentemente, muito mais restritivas que as que estão consagradas nos Estatutos do PCP.
Existindo princípios e regras semelhantes noutros partidos, só escolhemos o exemplo do PSD em homenagem ao Prof. Marcelo Rebelo de Sousa, que tanto tem zurzido no férreo partido que o PCP seria, e que em próxima crónica na TVI, não deixará de esclarecer como é que, como líder do PSD, foi cúmplice de tão infames regras.
Mas deve entretanto ficar claro que também nos Estatutos do PS, entre os deveres dos militantes, se incluem coisas como «guardar sigilo sobre as actividades internas dos órgãos do Partido de que sejam titulares ou a que assistam como participantes, observadores ou convidados»; «ser leal ao Programa, Estatutos e directrizes do Partido, bem como aos seus Regulamento»: «respeitar, cumprir e fazer cumprir os presentes Estatutos e seus Regulamentos, bem como as decisões dos órgãos do Partido».
E, quanto a direitos, aí se consagra o de «exprimir livremente a sua opinião» mas acrescentando que isso é «a todos os níveis da organização do partido» e se «reconhece aos seus membros liberdade de crítica e opinião, exigindo o respeito pelas decisões tomadas democraticamente nos termos dos presentes Estatutos».
Depois disto, convém porém atalhar em relação a eventuais «tresleituras» desta crónica.
Sublinhando que, pela nossa parte, lembrando tudo isto, não estamos a alinhar o PCP pela fasquia de outros. Nem a proclamar a absoluta perfeição, a intocabilidade ou a natureza sagrada das regras em vigor no PCP. Nem a contestar o direito de qualquer membro do PCP, pelos meios estatutários, defender as alterações que entender, o que é bastante diferente de as tentar impor através de factos consumados.
Estamos apenas e tão só, mais uma vez contra a corrente, a tentar contribuir para que, em alguns espíritos preconceituosos e almas ignorantes que em diversos órgãos de informação (certamente das estruturas mais centralistas da sociedade portuguesa) tanto andam a fustigar as supostas ou reais regras do PCP, se acenda um fio de luz feito de bom senso, sentido de justiça e respeito pela verdade.
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Tem a palavra o Professor
Artigo de Vítor Dias no "Semanário"
Sexta, 19 Abril 2002
Com a preciosa contribuição das «vítimas», graças ao maremoto de correspondentes comentários na generalidade da comunicação social e à ajuda de centenas de títulos sobre «expulsões» e «purgas» sempre iminentes, talvez não seja de admirar que boa parte da opinião pública esteja a receber a imagem do PCP como um partido onde não se tolerariam opiniões divergentes, onde se existiriam «delitos de opinião» que são sancionados e cuja vida interna decorreria debaixo de regras não apenas muito próprias mas também chocantemente autoritárias.
Porém, com graves prejuízos para a compreensão desta situação, praticamente ninguém explicou com detalhe que tenebrosas regras são essas cuja aplicação ou desejo de ver respeitadas estão por detrás da famosa «sanha persecutória» que percorreria o PCP.
É esse verdadeiro serviço público que hoje queremos prestar. De facto, as coisas só podiam ser como estão a ser num partido que, no artº 2º dos seus Estatutos, consagra «a liberdade de discussão e reconhecimento do pluralismo de opiniões» mas de imediato, em limitação de recorte estalinista, esclarece que isto é «dentro dos órgãos próprios do Partido», o que, como é bom de ver, inviabiliza a celebrada «circulação horizontal de informação» . E que, logo a seguir, num inaceitável ataque à liberdade de opinião e à individualidade dos seus membros, prescreve como principio da organização «o respeito por todos pelas decisões da maioria, tomadas segundo os presentes Estatutos». E que, ao descrever no artº 6º os direitos dos militantes, situa «no interior do Partido» o direito a «discutir livremente os problemas nacionais e internacionais».
De facto, as coisas não podiam ser diferentes num partido que, no seu Regulamento de Disciplina, elenca um pormenorizado e doentio conjunto de 15 infracções disciplinares.
Na verdade, nesse detestável Regulamento definem-se como infracções disciplinares dos militantes (passíveis de diversas sanções) coisas como (ler com atenção, por favor): o «tornar conhecidos, seja por que forma for, factos ou decisões referentes à vida interna do Partido e dos quais se tenha sabido no exercício de cargos, funções ou missões para que tenha sido designado»; a «defesa pública de posições contrárias aos princípios (...) do programa partidário»; o «manifesto desrespeito pelas deliberações emitidas pelos órgãos competentes do Partido, designadamente através dos órgãos de comunicação social»; a «inscrição em qualquer associação política não filiada no Partido» se feita sem conhecimento da direcção nacional do partido; a «participação», sem autorização dos órgãos nacionais, «em qualquer actividades susceptível de contrariar as directrizes dos competentes órgãos do Partido»; o «comportamento provadamente lesivo dos objectivos prosseguidos pelo Partido»; o «estabelecer polémica com outros membros do Partido fora dos quadros ou órgãos partidários desde que a discussão incida sobre deliberações dos respectivos órgãos estatutários e seja susceptível de pôr em causa a eficácia daquelas directrizes».
E, para terminar, só falta dizer que, com evidente incidência no mais recente «caso», aquele Regulamento de Disciplina vai ainda ao requinte de considerar como «circunstâncias agravantes» das 15 infracções disciplinares «a publicidade das faltas cometidas» e «ser o infractor titular de órgãos nacionais e regionais».
A quem aqui tenha conseguido chegar, está agora reservado um balde de água gelada ou, quem sabe, um suspiro de alívio. É que todas estas normas e regras aqui fastidiosamente reproduzidas não dizem respeito ao PCP mas – segurem-se! - aos Estatutos e ao Regulamento de Disciplina vigentes no PSD!.
Sendo ainda de acrescentar que são muito mais minuciosas e, consequentemente, muito mais restritivas que as que estão consagradas nos Estatutos do PCP.
Existindo princípios e regras semelhantes noutros partidos, só escolhemos o exemplo do PSD em homenagem ao Prof. Marcelo Rebelo de Sousa, que tanto tem zurzido no férreo partido que o PCP seria, e que em próxima crónica na TVI, não deixará de esclarecer como é que, como líder do PSD, foi cúmplice de tão infames regras.
Mas deve entretanto ficar claro que também nos Estatutos do PS, entre os deveres dos militantes, se incluem coisas como «guardar sigilo sobre as actividades internas dos órgãos do Partido de que sejam titulares ou a que assistam como participantes, observadores ou convidados»; «ser leal ao Programa, Estatutos e directrizes do Partido, bem como aos seus Regulamento»: «respeitar, cumprir e fazer cumprir os presentes Estatutos e seus Regulamentos, bem como as decisões dos órgãos do Partido».
E, quanto a direitos, aí se consagra o de «exprimir livremente a sua opinião» mas acrescentando que isso é «a todos os níveis da organização do partido» e se «reconhece aos seus membros liberdade de crítica e opinião, exigindo o respeito pelas decisões tomadas democraticamente nos termos dos presentes Estatutos».
Depois disto, convém porém atalhar em relação a eventuais «tresleituras» desta crónica.
Sublinhando que, pela nossa parte, lembrando tudo isto, não estamos a alinhar o PCP pela fasquia de outros. Nem a proclamar a absoluta perfeição, a intocabilidade ou a natureza sagrada das regras em vigor no PCP. Nem a contestar o direito de qualquer membro do PCP, pelos meios estatutários, defender as alterações que entender, o que é bastante diferente de as tentar impor através de factos consumados.
Estamos apenas e tão só, mais uma vez contra a corrente, a tentar contribuir para que, em alguns espíritos preconceituosos e almas ignorantes que em diversos órgãos de informação (certamente das estruturas mais centralistas da sociedade portuguesa) tanto andam a fustigar as supostas ou reais regras do PCP, se acenda um fio de luz feito de bom senso, sentido de justiça e respeito pela verdade.
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