2007-08-26
Força de expressão (20)
Reza o texto assinado por Luis Batista Gonçalves (na pág. 23 da edição em papel, e também aqui) que “De repente [o carneiro] parou junto ao stand de vendas que existe no lote 27 da rua Isabel Magalhães Colaço [e] (...) vendo a sua imagem reflectida no vidro, investiu sobre ele e, com uma marrada, partiu-o. Depois deitou-se à sombra, como se não fosse nada com ele”.
Não cedi à facilidade do leitor altaneiro que sorri e passa à frente com aquela desfaçatez com que se classificam as extravagâncias da chamada silly season.
Vejo agora, com toda a clareza, o que no inusitado evento transborda de significados e mensagens cabalísticas.
- 1º, pode estar a chegar o tempo em que os carneiros, desesperados, se isolam dos rebanhos e irrompem nas cidades, perturbando a mansidão transeunte;
- 2º, ao darem de frente com o seu reflexo nas montras dos locais de fatídico endividamento, a agressividade aumenta, e lançam-se contra a própria imagem, confundindo o que devem com o que lhes é devido;
- 3º, o seu acto heróico desestabiliza de tal modo a ordem estabelecida que a punição final tenta, com simétrica violência, eliminar a identidade simbólica do subversivo agitador. Vem mencionado no subtítulo da notícia que a “Polícia Municipal chamou o centro de recolha para levar o animal para o canil”.
Outro sinal dos tempos: um carneiro entre cães.
Quererá o Governo de José Sócrates perceber, atalhar caminho e, finalmente, compreender que entre direitos naturais e direitos adquiridos há desfeitas que não devem ser infligidas a um carneiro?
Um carneiro no canil!?
Como diriam os activistas verde-eufémios, não haverá também aqui um “bem maior” a preservar?