2008-02-13
O Jogo e as regras (6)
Quando o senador americano Barack Obama anunciou a decisão de concorrer nas primárias do Partido Democrata, o mundo dos analistas de diferentes quadrantes e calibres, encolheu os ombros. De acordo com a perspicácia de muitos comentadores, Obama tinha praticamente as mesmas ideias programáticas arvoradas por Hillary Rodham Clinton (talvez até menos exigente, do ponto de vista social, num ou noutro tópico), tinha carisma, era um fluente e persuasivo comunicador, mas..., mas teria contra ele quase tudo o que é importante para poder vir a ser o candidato efectivo dos democratas?
E o que era, afinal, esse "quase tudo"?
Primeiro, os americanos, no seu conjunto complexo, não estavam preparados para "aceitar" um presidente negro. Esta asserção é curiosa, porque deixa subentender que, mesmo eleito, os americanos poderiam não querer aceitá-lo.
Em segundo lugar, não teria a credibilidade nem a visibilidade do clã Clinton. Hillary tinha a vantagem de ser conhecidíssima como 1ª dama do presidencial esposo, Bill, ao longo de dois mandatos, aos quais se seguiu a carreira de senadora, sempre acompanhada da "espontânea" profecia de que viria a ser a 1ª mulher presidente dos States.
Em terceiro lugar, a mola real. Obama (diziam os doutos analistas) nunca conseguiria o financiamento necessário para uma campanha ganhadora. Os grandes contribuintes que influenciam a sorte da corrida, estavam a apostar, desde o início, decididamente, no clã Clinton.
E agora?, que Barack Obama ultrapassou Hillary Clinton e, mais do que isso, conseguiu imprimir uma dinâmica de esperança na "mudança" e confiança nas próprias forças?
Que explicações vai encontrar a vulgata analítica?
A astúcia arrogante não deixa aqueles que erraram redondamente as previsões com teorias de ocasião, reconhecer a pobreza do seu conservadorismo analítico. Isso corresponderia a reconhecer, por tabela, as bases frágeis em que, frequentemente, assentam os seus hábitos de se deixarem ir com o que parece ser a corrente dominante.
Fazem de conta que não é nada com eles. No fundo, nunca gostaram muito de debates em que pudessem ser contrariados.
Vão ter agora de inventar novas explicações.
E é essa, apesar de tudo, a vantagem que resta: podemos divertir-nos a comparar o que disseram antes com o que sustentam agora.
E isso, só por si, já está a proporcionar alguns golpes-de-rins hilariantes.
E o que era, afinal, esse "quase tudo"?
Primeiro, os americanos, no seu conjunto complexo, não estavam preparados para "aceitar" um presidente negro. Esta asserção é curiosa, porque deixa subentender que, mesmo eleito, os americanos poderiam não querer aceitá-lo.
Em segundo lugar, não teria a credibilidade nem a visibilidade do clã Clinton. Hillary tinha a vantagem de ser conhecidíssima como 1ª dama do presidencial esposo, Bill, ao longo de dois mandatos, aos quais se seguiu a carreira de senadora, sempre acompanhada da "espontânea" profecia de que viria a ser a 1ª mulher presidente dos States.
Em terceiro lugar, a mola real. Obama (diziam os doutos analistas) nunca conseguiria o financiamento necessário para uma campanha ganhadora. Os grandes contribuintes que influenciam a sorte da corrida, estavam a apostar, desde o início, decididamente, no clã Clinton.
E agora?, que Barack Obama ultrapassou Hillary Clinton e, mais do que isso, conseguiu imprimir uma dinâmica de esperança na "mudança" e confiança nas próprias forças?
Que explicações vai encontrar a vulgata analítica?
A astúcia arrogante não deixa aqueles que erraram redondamente as previsões com teorias de ocasião, reconhecer a pobreza do seu conservadorismo analítico. Isso corresponderia a reconhecer, por tabela, as bases frágeis em que, frequentemente, assentam os seus hábitos de se deixarem ir com o que parece ser a corrente dominante.
Fazem de conta que não é nada com eles. No fundo, nunca gostaram muito de debates em que pudessem ser contrariados.
Vão ter agora de inventar novas explicações.
E é essa, apesar de tudo, a vantagem que resta: podemos divertir-nos a comparar o que disseram antes com o que sustentam agora.
E isso, só por si, já está a proporcionar alguns golpes-de-rins hilariantes.
Comments:
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Obrigado, caro anónim@ pelo comentário tão breve quanto certeiro:
"Hillary antes".
Depois, foi o que se viu.
"Hillary antes".
Depois, foi o que se viu.
Por essas e por outras é que quando me falam de especialistas me lembro logo daqueles políticos que os comiam ao pequeno almoço. E fizeram grandes impérios...
Vê-se pelos comentários ao anterior post do Raimundo sobre Obama e as eleições americanas, que a desconfiança em relação à América continua a ser muito grande. A esquerda, traumatizada por anos e anos de decepções, não acredita em nada que venha do outro lado do Atlântico e até tende a esquecer o que historicamente de lá veio de bom para todo o mundo. Não vou falar disso agora, nem ficar muito impressionado com os comentários muito, muito de esquerda daqueles que, na sua coluna semanal, dizem que todos são candidatos do sistema. Ou seja, que são todos iguais.
Por mim, continuo a pensar, com base nos factos conhecidos, que a candidatura de Obama vai no sentido do que de melhor a América tem e daquilo que o mundo neste momento mais precisa. Ou seja, o mundo precisa de regulação, de multilateralismo, de diálogo e de paz. Só o facto de Obama aceitar - aliás na esteira de grandes democratas americanos (vide, o último vídeo de Stiglitz, de 6 horas, “Para onde vai o mundo”) - que o mundo precisa de regulação constitui uma vitória extraordinária sobre tudo o que na América tem sido feito desde Gerald Ford, de uma forma ainda incipiente, e depois por Carter, com avanços e recuos, e a seguir, de uma forma consolidada, por Regan, Bush (pai), Clinton até à selvajaria do actual Bush. Os nossos aprendizes neoliberais que têm passado o seu tempo a macaquearem os boys de Chicago e os neocons vão ficar muito desamparados se na presidência da América estiver alguém que, pela sua política interna, puser em causa estes pretensos dogmas. E quem diz os nossos, diz também os de Bruxelas. Como desamparados ficarão se o papel do Estado em áreas donde tem sido escorraçado ou donde está em vias de o ser voltarem a ser ocupadas para se alcançar uma sociedade mais justa, mais igualitária.
Claro que este percurso não vai ser fácil, apesar de contar com um extraordinário apoio popular: principalmente, dos jovens, das classes cultas e progressistas e dos afro-americanos. Os interesses instalados são muito fortes e capazes de recorrer a todos os meios para impedir a mudança. Como também se terá de contar com a acção dos extremistas que obviamente preferem um governo de tipo Bush e que, do outro lado, tudo tentarão para impedir a mudança.
Depois há ainda na candidatura de Obama um outro aspecto que tem sido muito pouco realçado e que é hoje de grande importância. Refiro-me aos limites da democracia representativa, ou seja, ao controlo dos representantes através de mecanismos de democracia directa. Esta preocupação, que vai no sentido das boas tradições democráticas americanas, será igualmente muito importante para a esquerda europeia. Apesar da esquerda do velho continente continuar muito ligada ao mito da vontade geral e ao jacobinismo que dela decorre, vamos ter esperança que novos tempos virão…
JM Correia Pinto
Por mim, continuo a pensar, com base nos factos conhecidos, que a candidatura de Obama vai no sentido do que de melhor a América tem e daquilo que o mundo neste momento mais precisa. Ou seja, o mundo precisa de regulação, de multilateralismo, de diálogo e de paz. Só o facto de Obama aceitar - aliás na esteira de grandes democratas americanos (vide, o último vídeo de Stiglitz, de 6 horas, “Para onde vai o mundo”) - que o mundo precisa de regulação constitui uma vitória extraordinária sobre tudo o que na América tem sido feito desde Gerald Ford, de uma forma ainda incipiente, e depois por Carter, com avanços e recuos, e a seguir, de uma forma consolidada, por Regan, Bush (pai), Clinton até à selvajaria do actual Bush. Os nossos aprendizes neoliberais que têm passado o seu tempo a macaquearem os boys de Chicago e os neocons vão ficar muito desamparados se na presidência da América estiver alguém que, pela sua política interna, puser em causa estes pretensos dogmas. E quem diz os nossos, diz também os de Bruxelas. Como desamparados ficarão se o papel do Estado em áreas donde tem sido escorraçado ou donde está em vias de o ser voltarem a ser ocupadas para se alcançar uma sociedade mais justa, mais igualitária.
Claro que este percurso não vai ser fácil, apesar de contar com um extraordinário apoio popular: principalmente, dos jovens, das classes cultas e progressistas e dos afro-americanos. Os interesses instalados são muito fortes e capazes de recorrer a todos os meios para impedir a mudança. Como também se terá de contar com a acção dos extremistas que obviamente preferem um governo de tipo Bush e que, do outro lado, tudo tentarão para impedir a mudança.
Depois há ainda na candidatura de Obama um outro aspecto que tem sido muito pouco realçado e que é hoje de grande importância. Refiro-me aos limites da democracia representativa, ou seja, ao controlo dos representantes através de mecanismos de democracia directa. Esta preocupação, que vai no sentido das boas tradições democráticas americanas, será igualmente muito importante para a esquerda europeia. Apesar da esquerda do velho continente continuar muito ligada ao mito da vontade geral e ao jacobinismo que dela decorre, vamos ter esperança que novos tempos virão…
JM Correia Pinto
Há um ano um amigo americano - veterano das campanhas pelo Direitos Cívicos do tempo de MLK - chamou-me a atenção para Obama: "Tem um discurso de Estadista... Não parece um político..."
Neste momento tudo aponta para o favoritismo de Obama: as sondagens dizem que ele terá uma vantagem mais confortável em relação a McCain, os superdelegados dificilmente se oporão às bases do partido (isso aconteceu no passado), e só uma derrota estrondosa no Texas e no Ohio poderão derrotar definitivamente e sua candidatura.
É pena que o Partido Democrata tenha dois bons candidatos e um deles tenha de ficar pelo caminho.
Neste momento tudo aponta para o favoritismo de Obama: as sondagens dizem que ele terá uma vantagem mais confortável em relação a McCain, os superdelegados dificilmente se oporão às bases do partido (isso aconteceu no passado), e só uma derrota estrondosa no Texas e no Ohio poderão derrotar definitivamente e sua candidatura.
É pena que o Partido Democrata tenha dois bons candidatos e um deles tenha de ficar pelo caminho.
Caro Manuel Correia
Muitos dos nossos analistas profissionais lembram-me os artistas de rua que a partir do mesmo balão comprido, "fininho" e cheio apenas de ar, fazem num instante o bichinho que tu quiseres...
Abraço
Muitos dos nossos analistas profissionais lembram-me os artistas de rua que a partir do mesmo balão comprido, "fininho" e cheio apenas de ar, fazem num instante o bichinho que tu quiseres...
Abraço
Por mais que eu gostasse, não consigo acreditar que Clinton ou Obama consigam ganhar as eleições.
Alguma vez o país que elegeu o Bush por duas vezes vai eleger uma mulher ou um negro islâmico para presidente?
Era bom, mas aposto que não.
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Alguma vez o país que elegeu o Bush por duas vezes vai eleger uma mulher ou um negro islâmico para presidente?
Era bom, mas aposto que não.
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