2008-12-04
"A Ciência Económica vai Nua"
Ainda bem que um grupo de Professores de várias escolas de economia deste País se associa para lançar um grito conjunto!!.
Os tempos de crise tornaram-se tempos de acção inovadora, inesperada, imprevista. Por todo o mundo tem-se observado um movimento por parte dos governos que tentam estabilizar a situação e revertê-la. Predominam políticas conjunturais mas, caso singular à escala global, assiste-se à tomada de iniciativas coordenadas para consertar uma arquitectura financeira internacional demasiado permeável a falhanços sistémicos.
É das escolas de economia e gestão de todo mundo, sobretudo dos Estados Unidos, que tem saído uma boa parte dos operadores dos mercados financeiros e gestores de topo que lentamente acumularam decisões insustentáveis culminando na actual crise. Esta crise é também por isso um colapso teórico, uma falência de um modo de ver. A má teoria é, evidentemente, um elemento central da crise.
A teoria económica convencional pressupõe, mais do que demonstra, que os agentes optimizam e os mercados harmonizam. A ideia de "mão invisível" é uma expressão usada uma só vez por Adam Smith, o filósofo celebrado como o pai da ciência económica, nas muitas páginas de A Riqueza das Nações. No entanto, Smith começa o seu livro por sublinhar a importância crucial da organização e do conhecimento, algo que os manuais modernos preferem ignorar. E importa lembrar que, para além deste, ele escreveu outro grande livro: A Teoria dos Sentimentos Morais. Muito boa gente acha que só o primeiro é ciência, é economia.
Não é, portanto, ousado supor que no ensino da economia e da gestão tudo ainda continua como dantes, alheio a uma crise talvez descrita como mera mas rara anomalia, numa atitude fechada e defensiva face aos desafios do pensamento crítico. No entanto, não podemos esquecer que os operacionais dos mercados têm sido formados neste contexto intelectual. Ou seja, dificilmente o ensino da economia e da gestão não estará implicado nas causas da crise.
Há, portanto, necessidade de responsabilidade e realismo crítico no ensino das ciências económicas e empresariais, esses campos em evolução e sempre politicamente carregados. Algumas editoras têm aliás procurado reflectir a procura por maior pluralismo no ensino da economia. Referimo-nos, por exemplo, às abordagens neo/pós-keynesianas, evolucionistas e institucionalistas - um portfólio de perspectivas para lidar com um mundo económico complexo, multidimensional e persistentemente surpreendente. É urgente que a academia as tire da sombra e lhes atribua o devido destaque.
João Ferreira do Amaral (ISEG), Manuel Branco (Universidade de Évora), Sandro Mendonça (ISCTE), Carlos Pimenta (Universidade do Porto), José Reis (Universidade de Coimbra)