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2014-03-21

 

Donetsk em ebulição na Ucrânia pró-Rússia

 
Extratos da reportagem de Paulo Moura, em Donetsk, (Ucrânia) no Público de hoje (link):

(Mapas e imagens são da cidade de Donetsk tiradas de aqui )
 
«A população nunca tinha sentido essa necessidade, nem a situação económica justificava agitação social. Mas agora o medo dos“fascistas” de Kiev, em certa medida empolado artificialmente, faz crescer o medo e a divisão. “Tentámos criar um país, mas não foi possível”,dizem os manifestantes na Praça Lenine.

A discussão começa todos os dias a meio da tarde. É uma combinação de tertúlia de reformados com uma acção de agit/prop, ali junto à estátua de Lenine, no centro de Donetsk, sob temperatura negativa. “Há dois meses, eu daria a vida pela Ucrânia”, diz uma mulher, exaltada com as mudanças a que tem assistido em si própria. “Mas o que aconteceu em Maidan matou o meu amor pela Ucrânia.”


 Isto não quer dizer que não seja patriota, explica ainda a mulher, Ana Ivanova, 60 anos, professora primária.“Sou mais patriota do que os fascistas de Maidan.” Para ela, não há incoerência entre patriotismo e o facto de se ter acabado de trocar de pátria. Para Valentina Kavalienka, 50 anos, professora, mas de Matemática, também não.“Já me habituei à ideia de perder a Ucrânia”, diz ela, transformando isso num acto de coragem. “Eu não tenho medo por mim, mas pelos nossos filhos e netos. Todas estas pessoas choram pelo país que perderam. Mas não somos traidores.”

Ana pede para recitar um poema que escreveu sobre a situação: “Maidan roubou a minha boa mãe/ Deu-me uma má madrasta./ Agora quero ir para casa.”

Não há slogans nem cânticos na manifestação dos patriotas sem pátria. O grupo de menos de cem pessoas, na maioria mulheres, nenhuma com menos de 50 anos, discute com raiva, sobrepondo vozes e argumentos. “Os fascistas estão a chegar. Já criaram milícias e começaram a matar as pessoas que falam russo. Cada um de nós pode ser o próximo. Estão a chegar, como em 1933, os fascistas”, diz Valentina Kavalienka. “Em Kiev já estão a ensinar nas escolas que é preciso matar os 'moscal'.”

É um termo pejorativo que designava os ucranianos que traziam o sotaque de Moscovo, por terem servido no Exército do Império Russo. Hoje é o insulto usado para definir os ucranianos do Leste e Sul, de origem e língua russa. Estes chamam “banderas”aos ucranianos do Ocidente, numa referência a Stepan Bandera, o líder nacionalista que colaborou com os nazis, combatendo os russos.
 
 
“Há 24 anos que tentamos construir um país. Mas não foi possível”, diz Valentina. “O problema começou em 1991, com o colapso da União Soviética. Nunca nos perguntaram se concordávamos. Foi ilegal romper o acordo que existia entre as repúblicas.” ......

.... Economicamente, a região do Donbass tem fortes ligações com a Rússia, embora seja fundamental para a Ucrânia. As minas de carvão e as fábricas de aço produzem parte significativa da riqueza da Ucrânia, embora os seus clientes sejam maioritariamente russos. Nem poderá ser de outra forma, uma vez que a sua produção não cumpre os critérios de qualidade da União Europeia, dizem os economistas na região. E reconhecem que, com uma exploração adequada destes argumentos, é provável que tanto russos como industriais e trabalhadores do lado ucraniano venham a considerar a anexação do Donbass na Rússia como do seu interesse.

Alexandra Karabenikova, 28 anos, designer de jardins, vive há cinco anos em Donetsk e nunca foi à Rússia, cuja fronteira fica a cerca de 200 quilómetros. “Nunca senti vontade de ir lá. Para quê?" Donetsk é uma metrópole com mais de um milhão de habitantes, e Alexandra gosta de viver aqui. “Há muitos parques, muita coisa para fazer”, diz ela, sentada num restaurante enorme, repleto de jovens. Os monitores de televisão emitem videoclipsde bandas russas e ucranianas. Alexandra nem sempre distingue uns dos outros.“O que significa isso de ser etnicamente russo? Não sei. Quer dizer que cantam o hino russo? Eu nem sei distinguir os russos dos ucranianos”, diz ela, que tem mãe russa e pai ucraniano.

As questões identitárias só foram exacerbadas nos últimos meses. O cariz nacionalista ou fascista que assumiu a revolução da Maidan de Kiev assustou os russos das regiões de Donetsk, Karkhiv, Dnepropetrovsk, tal como aconteceu com os da Crimeia. Em Donetsk, cerca de 40% da população tem origem russa, mas são mais de 60% os que têm o russo como primeira língua.

As declarações contra os russos, contra os “moscal”,feitas pelas novos governantes de Kiev lançaram o medo nalgumas franjas da população. O fantasma dos “banderas”e dos fascistas foi crescendo, em grande medida empolado artificialmente. Segundo as autoridades de Kiev, por obra dos serviços secretos russos.

As claques de futebol do Shakhtar Donetsk
É difícil distinguir informação e rumor, quando se fala da presença na região de milícias pró-Maidan, constituídas por elementos do Sector Direito e outros grupos radicais. É verdade que os grupos mais visíveis de activistas pró-Ucrânia foram constituídos pelas claques de futebol do clube Shakhtar Donetsk. O seu estilo violento e fascizante não ajudou a dissipar os medos da comunidade russa.
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