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2005-08-21

 

A revolução que falta

Referiro-me apenas à revolução na Administração Pública. Apenas! Tal revolução apresenta, no entanto, perigos difíceis de avaliar. Teria um efeito devastador na nossa capacidade de impedir o progresso. Acabaria com a nossa tradicional e saudável resistência ao aumento da produtividade da economia. E como ocupariam os Portugueses o seu tempo sem a oportunidade de gozar a distração das agradáveis repartições da Administração Pública?

Vou deixar aqui uns casos à consideração de Sócrates, de António Costa (que se responsabilizou pela reforma da Administração) e de Maria Manuel Leitão Marques coordenadora da Unidade de Coordenação da Modernização Administrativa na presidência do Conselho de Ministros.

Caso Primeiro - O Célebre Caso do IMI

O Sr Antunes comprou casa e foi à repartição de finanças pedir a isenção de pagamento do IMI a que tem direito, durante 3 anos. Tem 60 dias após o início da habitação da nova casa para tratar disto. Que exagero - pensou - para fazer um pedido.

No dia 2 de Maio de 2005, uma semana depois da mudança, o Sr Antunes estava na repartição de finanças (RF) a tratar do IMI.
- Tem de trazer uma declaração da Segurança Social (SS) a provar que não lhe deve nada.
No dia seguinte o Sr. Antunes foi à hora de almoço à Loja do Cidadão. A fila tinhas horas e perdeu a tarde de trabalho.
- O Sr é ou foi também trabalhador independente(TI)?
- Sim - coisa de uns trocos - mas sempre em simultâneo com trabalho por conta de outrém e portanto sempre a descontar para a SS.
- Não temos registo aqui na SS. Tem de ir à RF e pedir certificado do início, fim e interrupções como TI.
Depois de espera na bicha, comprar o impresso necessário e pagar taxas de vários euros voltou o Sr. Antunes ao balcão inicial informaram-no que voltasse lá daí a 2 dias buscar o papel.
Munido da informação da repartição de finanças regressou o Sr. Antunes à SS. Mas analisada a sua ficha no computador a funcionária diz-lhe que há um período em que é TI e não desconta para a SS. O incansável Sr Antunes chama-lhe a atenção que nesse período descontou como funcionmário público para a CGA. Como a funcionária lhe garantiu que o seu sistema informático não tinha acesso ao da CGA lá foi o "portuga" à CGA. Felizmente estava na Loja do Cidadão, foi só descer um andar e logo ali lhe confirmaram o que ele já sabia. Mas... mas nem a funcionária da CGA podia informar a da SS nem esta podia vir um andar abaixo tomar conhecimento de tal, o Sr Antunes tinha de comprar um impresso, pagar uns quantos euros e aguardar calmamente em casa que 10 dias depois a CGA lhe enviasse pelo correio a prova de que tinha feito os devidos descontos.
Ao fim de apenas 16 dias o Sr Antunes correu felissíssimo à SS de papel em riste. Mas... que não Senhor ali não lhe davam papel nenhum. A tão cobiçada declaração comprovativa de que nada deve à SS chegará ordeiramente a sua casa pelo correio 10 dias depois.
Duas semanas após chegou o papel da SS. Mas enigmático. Não dizia preto no branco que não devia nada. referia um decreto e uns artigos. Bom, Deus (no caso a SS) escreve direito por linhas tortas. Foi às Finanças. Foi gozado. Aquele papel não era a tão anseada declaração de bom comportamento perante a SS. Foi à SS saber o que se passava. Que aquele ofício e os conspícuos decretos e artigos que referia destinava-se a comprovar a regularização da sua situação como trabalhador independente junto da SS e que apesar de largamentre ultrapassados os 10 dias a declaração de ausência de dívidas haveria de chegar. E chegou, depois de vários telefonemas para os serviços da verdadeira SS (não para a SS da Loja do Cidadão porque essa é só um terminal para enviar recados aos verdadeiros serviços da SS) depois de vários telefonemas, esperando entre 15 a 30 minutos que atendessem o telefone, nos dias em que atenderam, a "DECLARAÇÃO" da SS chegou. Chegou 48 dias depois, em 9 de agosto de 2005. Porque se meteu o Julho e o Agosto, as férias...
Na repartição de finanças o Sr. Antunes levava o discurso preparado para "vender" cara a multa com uma refinada colecção de impropérios e mimos ao Governo. Porque os tais 60 dias não chegaram. Passavam exactamente 97 dias desde o dia em que fora diligentemente tratar do IMI e 104 desde que habitava a nova casa.
Final feliz. Oh meu amigo a gente já está habituada a essa trapalhada toda. Basta que o Sr. me diga que começou a habitar a casa ontem e eu confio.
E assim ficou 97 dias depois, 8 deslocações aos balcões do Estado, 5 tardes de trabalho perdidas, e várias taxas para pagar a máquina emperrada da Administração Pública.
Solução A - quem muda de casa contacta a repartição de finanças pela internet e faz o seu pedido. A repartição de finanças consulta todos os serviços do Estado necessários
e liberta o cidadão de mais tormentos.
Solução B - o cidadão vai à repartição de finanças e o funcionário consulta por computador a SS, os seus serviços (das Finanças) que tratam dos trabalhadores independentes, a CGA e 20 minutos depois, no caso de o sistema informático estar lento, resolve o que demorou 97 dias dinheiro e saúde ao Sr. Antunes.
Têm de se colocar os sistemas informáticos a falar uns com os outros ou substituí-los (Cada serviço comprou o seu. Talvez conforme as comissões). Sei que isto custa dinheiro e leva algum tempo. Mas digam-nos se estão a trabalhar para isto e para quando prevêm uma Adminitração Pública digna do nome.
Mas não é só de tecnologia que se trata. É também de outro modo de encarar os deveres da Administração Pública e os deveres (os impostos) e os direitos dos cidadãos.
Por que tem o cidadão que se inscreve como trabalhador independente e já desconta como trabalhador por conta de outrém para a SS, de ir à SS comunicar que também é TI desde o dia tal? Todas estas obrigações de andar de repartição em repartição a informar são, em muitos países, uma tarefa da Administração Pública que comunica entre si.

Caso segundo: Actualizar o BI

O Sr Antunes na sequência da mudança de casa foi à Loja do Cidadão informar o Registo Civil do fausto acontecimento. Tem de pedir um BI novo. Compre aí um impresso, junte duas fotografias pague 7 € e tal preencha, entregue, dê-me o seu BI para ser destruído e volte cá daqui a 10 dias.
O Sr Antunes retorquiu, com amor ao seu cartãozinho não o queria destruído, que não havia alteração nenhuma a fazer no cartão do seu BI porque não mudava sequer de freguesia. Bastava que alterassem a morada no computador, ou nos registos centrais. O funcionário recuperou do contratempo e observou que tinha de entregar o cartão porque passava também a ser uma renovação (alargamento do prazo de validade) o que dava uma vantagem ao cidadão. Infelizmente o Sr. Antunes devido ao correr dos anos possuía um cartão vitalício! Desarmado, o pobre do funcionário teve de se munir da autoridade que o Estado lhe dá e respondeu vitorioso que mesmo assim tinha que dar o cartão para ser destruído e pagar os devidos euros (para amortizar a máquina corta-papel e o trabalho dele a gastar os neurónios com a minha insolência)Porque era a lei, ponto final.

Caso Terceiro. O caso da micro-empresa em crise.

O Sr Antunes mudou a sede da sua micro-empresa de Lisboa para a Amadora. Já se sabe a crise, pagamentos em atraso, falência à espreita, enfim um escritório mais barato.
Foi à Conservatória do Registo Comercial de Lisboa fazer o registo. O Sr tem de ir primeiro ao registo Nacional de Pessoas Colectivas para saber se autorizam o nome da sociedade no outro concelho, informaram-no com simpatia. Mas como assim? A autorização do nome tinha âmbito nacional! Bem, explicaram-lhe depois, é preciso pagar a máquina do estado.
Foi rápido, pediu urgência, pagou mais 28€ e ficou tudo por 80€. Na Conservatória também não demorou muito. Os 140€ é que tornou o caso mais desagradável mas como registou também a mudança de gerência... Faltam ainda cobrarem-lhe talvez uns 150€ para a publicação no Diário da República.
Mal a empregada chegou de férias mandou-a à repartição de finanças informar da mudança de sede. O pior foi aí. Tinham passado mais de 15 dias da data da acta que mudava a sede. 100 € de multa. Ah não! é que a data da mudança de gerência tem aqui Novembro de 2004, ano anterior, portanto mais duzentos, o que perfaz 300€ de multa.
Em resumo o Sr. Antunes gabava-se, no café, que o Estado para facilitar a vida à sua micro-empresa lhe comeu sem justificação plausível quase 700€. Mas ao mesmo tempo estava muito feliz porque apesar de se tratar tudo de pequenos truques para sacar dinheiro à micro-empresa em dificuldades estava a contribuir para o resolução do défice.

Comments:
A ARA... liberal!...
 
Posta no papel a situação é mais arrepiante. Todos a conhecemos e alguma vez passámos por ela.
Esta burocracia faz parte do funcionalismo público e serve para justificar a entrada contínua de reforços.
Grave é que o simples funcionário se adapta muito bem a este papel e sente um certo prazer sádico ao presenciar o esgar de raiva e desalento na cara do utente, quando lhe comunica que ainda falta mais qualquer coisa...
 
Não sei se estes comments e de algum modo o próprio post que constitui um desafo legítimo não pode enviesar o problema na sua verdadeira matriz. Por muito mal que se diga da AP, e como em todas as profissões há bom e mau, a grande responsabilidade de tudo isto não está no funcionário x,y ou z. O mal do não funcionamento começa por não haver uma estratégia-base que assenta noq ue é o Estado e para que serve, as equipas ministeriais, certamente porque pensam estar pouco tempo, rodeiam-se de gente que nem cheira os problemas da AP. E finalmente as chefias que não tem poder e por isso não são responsabilizadas e quando o forem poucos são os que aceitam. Só mesmo um cataclismo pode mudar isto. Ana Esteves
 
Ao António:a ARA já cumpriu o seu papel. Se outros tivessem cumprido o seu teríamos evitado o trabalho de a criar.
Ao Carlos e à ANA. No post não são os funcionários públicos que estão em causa. Como em todos os grandes grupos há bons e maus e o que é comum é os governos não aproveitarem os quadros de elevada qualidade que têm na AP e gastarem milhões fora. Da minha experiência mais recente que não foi pequena fica-me a ideia de que se evoluiu muito e já é bastante minoritário o antigo paradigma do funcionário incompetente e sobranceiro. A maioria dos funcionários com quem tive de contactar foram atenciosos e boa parte verdadeiramente cooperantes e competentes.
O problema é reformar ( e não... ir reformando) e isso é tarefa, e grande, dos governos.
 
Faltou-me agradecer ao António e ao Carlos a sua visita e comentários. E ao António que se o conteúdo do post é apoiado pelos "liberais" (âmbito económico) tanto melhor mas creio que será apoiado por todos os credos que queiram o bem do país.
Á Ana não faz sentido agradecer já a considero uma colaboradora atenta e indispensável ao Puxa Palavra.
 
Creio que o raimundo Narciso terá estado no departamento de Informação do PC. Sabendo o que sabiam sobre Soares, o PC também foi conivente com a situação de abuso que foi instalada em Portugal.

A não ser que, tal como na história que hoje se conta sobre Lula, e a o contrário do Mickey e do Pato Donald, o Pc fosse o...
 
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