2007-06-19
Poderes e ouvidores (5)
Se tentarmos escapar à tentação malévola dos processos de intenção, o meu poste anterior constatava o enfraquecimento do Governo e, passando agora por cima dos aspectos estruturais (remodelação casuística com a saída dos três ministros de estado iniciais); da severidade e brutalidade de algumas políticas públicas que qualquer governo de direita, com o PS na oposição, seria obrigado a fazer mais negociadamente; e, finalmente, dos casos de paranóia intolerante e persecutória (processo Charrua, exclusão da Associação dos Professores de Matemática, e agora, pasme-se, a intimação do blogger do Portugal Profundo), não me parece que possa ser acusado de estar a falar de coisas que não reconheçamos como marcas dos tempos que correm...
A prestação governativa, convenhamos, tem tido os seus problemazitos...
Brinda-me com um poste intitulado “Crueldade com crueldade se paga”, e puxando das suas artes bem firmadas de escritor ágil, mordaz e contundente, coloca uma questão pertinente, de mistura com um floreado retórico que consiste em atribuir-me crenças, intenções e disposições, fruto da sua imaginação romanesca.
De facto, eu sustento que Sócrates defraudou a expectativas de muitas gentes que votaram no PS acreditando que, desta vez, iria ser diferente. Não estou a falar da história dos impostos (o primeiro balde água fria), nem do Simplex (que a direita teria desejado fazer, se pudesse e soubesse), estou a referir-me ao desvario do encerramento de maternidades, escolas, serviços de urgência; estou a apontar para a desertificação do interior, para os cortes cegos, apressados e desarticulados.
Sem ponta de malícia, volto a sustentar que o PS deveria fazer alguma coisa.
Porquê?
Porque, se não, vai acontecer como das vezes anteriores. Regressa a “direita mesmo”. E este rotativismo tácito, deveria exigir de nós, para começar, uma maior acutilância e frontalidade na crítica aos governantes.
Há crueldade na forma como o Governo defrauda as expectativas que o PS alimentou ao ponto de conseguir uma histórica maioria absoluta?
Há. Extrema e dolorosa.
É verdade, amigo João Tunes, que as esquerdas estão de pantanas e que muitos dos que divisam diferenças substanciais entre a esquerda e a direita, dificilmente se porão de acordo nos próximos tempos.
Concedo.
Porém não me conformo com um Partido Socialista que em nome de uma putativa “nova esquerda” levou, primeiro, Veiga Simão; depois, Sousa Franco; e, agora, Freitas do Amaral a explicarem, com naturalidade, que não foram eles que viraram à esquerda...
Não me parece que a comoção seja demasiada ao enfrentarmos isto.
É a política.
Continuo a pensar que o PS deveria fazer algo mais do que isto.
Manifestei em alguns posts anteriores algum descontentamento sobre a forma como a governação está a decorrer.
Estou de facto triste, desanimado e preocupado por ver que em áreas como a educação as prometidas reformas não estão a ter continuidade.
De facto a tão falada "coragem" foi demonstrada apenas contra aqueles que mais dificuldade tinham em se defender (os professores nas escolas).
Aos directores de DRE(s), responsáveis por exames e aqueles que se intitulam professores embora trabalhem no ME à mais de 10 anos todas as falhas se permitem e nada se lhes exige.
Algo terá de mudar neste governo e como disse num post atrás, o PS terá de o assumir com naturalidade e não como no tempo do governo Guterres em que se invocou a solidariamente do partido com o governo.
Discordo no entanto quanto à crueldade das mudanças. Elas têm de ser feitas. O País precisa delas.
O que me choca é não ver o mesmo grau de exigência para com todos, incluindo governo, deputados, bancos e mercado financeiro.
Se Veiga Simão, Sousa Franco e Freitas do Amaral defendem que não viraram à esquerda; se existem políticas públicas que qualquer governo de direita seria obrigado a fazer mais negociadamente; se se constatam casos de paranóia intolerante e persecutória: então que temos a recear do regresso da “direita mesmo”?
de acordo com quase tudo o que escreveste. Quanto às mudanças que precisam de ser feitas, a gradação, o faseamento e os impactos sociais conhecidos deixam-nos à beira da dúvida. Será o socialismo do PS algo para levar a sério?
Rui,
à partida, a "direita mesmo" tem menos esquerda. No horizonte possível, a influência do PS é crucial para viabilizar quaisquer soluções. Continuo a pensar que o PS pode fazer melhor. Suponho que o nosso dever é, pelo menos, lembrá-lo.
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